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Porque é que Jesus amaldiçoa a figueira?

Então há a curiosa história da figueira, que sempre me intrigou bastante. Lembra-se do que aconteceu com a figueira. “Ele estava com fome; e vendo uma figueira à distância a ter folhas, veio se porventura encontrasse alguma coisa sobre ela; e quando chegou a ela não encontrou nada além de folhas, pois o tempo dos figos ainda não tinha chegado. E Jesus respondeu-lhe e disse-lhe: “Nenhum homem come fruto teu para sempre” … e Pedro … disse-lhe: “Mestre, eis que a figueira que amaldiçoaste se murcha”. Esta é uma história muito curiosa, porque não era a altura certa do ano para os figos, e não se podia realmente culpar a árvore. Eu próprio não posso sentir que, nem em matéria de sabedoria, nem em matéria de virtude, Cristo está tão alto como algumas outras pessoas conhecidas da história. Penso que deveria colocar Buda e Sócrates acima dele nesses aspectos.

Por outras palavras: “Ele odeia esta figueira! Afasta-te da figueira!”

Não posso deixar de pensar como Russell teria abordado uma passagem como 1 Reis 11:26-40, na qual o profeta Ahijah rasga uma roupa em doze pedaços e instrui o rei a apanhar dez deles, prefigurando a divisão dos israelitas nas dez tribos do norte (Israel) e nas duas tribos do sul (Judá). Ao ler isto, procuraria ele compreender porque é que o profeta estava zangado com uma peça de vestuário e objectou que a peça de vestuário não tinha feito nada de errado? Ou será que compreenderia (como aparentemente não compreendeu na sua objecção à conduta de Jesus com a figueira) que a acção aqui é simbólica?

No caso de Jesus e da figueira, o simbolismo da acção de Jesus deveria ter feito sentido imediato, pois antes de amaldiçoar a figueira Jesus deu a Parábola da Figueira, tornando claro o significado simbólico (Lucas 13:6-9):

E ele contou esta parábola: “Um homem tinha uma figueira plantada na sua vinha; e veio à procura de frutos nela e não encontrou nenhum. E disse ao vinhateiro: “Lo, nestes três anos vim à procura de fruta nesta figueira, e não encontrei nenhuma. Corta-a; por que razão haveria de a usar no solo?’. E ele respondeu-lhe: ‘Deixe-o em paz, senhor, também este ano, até eu cavar sobre ela e colocar estrume’. E se der frutos no próximo ano, bem e bom; mas se não, pode cortá-la””

Esta imagem não é nada de novo. Como o profeta Isaías declarou, “ele vinha do Senhor dos Exércitos é a casa de Israel, e os homens de Judá são a sua agradável plantação; e ele procurou a justiça, mas eis que derramou sangue; a justiça, mas eis que chorou!” (Isa. 5:7).

p>Jesus deu a parábola da figueira “a caminho de cidades e aldeias, ensinando, e viajando para Jerusalém” (Lucas 13:22), e é no culminar desta viagem que o vemos amaldiçoar a figueira. Eis como São Marcos descreve a cena:

No dia seguinte, quando vieram de Betânia, ele estava com fome. E vendo ao longe uma figueira em folha, ele foi ver se encontrava alguma coisa nela. Quando chegou a ela, não encontrou senão folhas, pois não era a época dos figos. E disse-lhe: “Que ninguém volte a comer fruta de si”. E os seus discípulos ouviram-na. Ao passarem de manhã, viram a figueira murchar até às suas raízes. E Pedro lembrou-se e disse-lhe: “Mestre, olha! A figueira que amaldiçoaste murchou” (Marcos 11:12-14, 20-21).

A figueira não é um agente moral. Não é auto-consciente. E não está a ser castigada. Pelo contrário, a figueira é uma referência óbvia à esterilidade espiritual de Israel. Talvez tenha notado uma elipse na passagem acima: isso porque entre Jesus amaldiçoando a figueira e Pedro comentando-a no dia seguinte, Jesus entrou em Jerusalém e expulsou os cambistas do templo enquanto dizia “Não está escrito: ‘A minha casa será chamada casa de oração para todas as nações’? Mas vós fizestes dela um antro de salteadores” (Marcos 11,17). Em vez de interromper a maldição da figueira, esta acção tira mais claramente o seu significado: o julgamento está a ser visitado sobre Israel, e particularmente sobre Jerusalém.

p> Seria fácil ver isto simplesmente como julgamento sobre Israel infrutífero, mas Jesus deixa claro que a lição também se aplica a cada um de nós. Na Última Ceia, ele colocou-a nestes termos:

Eu sou a verdadeira videira, e o meu Pai é o vinhateiro. Cada ramo meu que não dá fruto, ele tira, e cada ramo que dá fruto ele poda, para que possa dar mais fruto. Já estais limpos pela palavra que vos falei. Permanecei em mim, e eu em vós. Como o ramo não pode dar fruto por si só, a menos que permaneça na videira, também vós não podeis, a menos que permaneçais em mim. Eu sou a videira, vós sois os ramos. Aquele que habita em mim, e eu nele, é ele que dá muito fruto, pois, para além de mim, nada podeis fazer. Se um homem não habita em mim, é lançado como um ramo e murcha; e os ramos são colhidos, lançados ao fogo e queimados (João 14:1-6).

A fecundidade espiritual é necessária na vida cristã. Como uma bicicleta que ou avança ou cai, não há lugar para uma espiritualidade estagnada. Na parábola dos talentos, o cristão espiritualmente estéril é retratado como um “servo inútil” não lucrativo e expulso do paraíso (Matt. 25:30). Somos chamados a permanecer em Cristo, e através dele, a dar muitos frutos.

Isto deixa um mistério. Marcos especifica que Jesus “não encontrou senão folhas, pois não era a época dos figos” (Marcos 11:13). Mas se é esse o caso, porquê amaldiçoar a figueira? São Josemaría Escrivá entendeu-o desta forma: “Não me digas que tens desculpas. Pouco aproveitou a figueira, conta o Evangelista, que não era a época dos figos quando o nosso Senhor veio a ela procurá-los”. Como explicação adicional, ele disse:

O nosso Senhor vem colher, sabendo muito bem que não vai encontrar nenhum nesta altura do ano. Contudo, quando a árvore se revela estéril apesar da sua aparente fertilidade e folhas luxuriantes, Jesus ordena: “Que nenhum homem coma jamais fruta sua no futuro”

P>Palavras duras, de facto! Que nunca mais produzais frutos! Como devem os discípulos ter-se sentido, especialmente se consideraram que foi a Sabedoria de Deus que assim falou? Jesus amaldiçoa a figueira porque nela encontrou apenas a aparência de fecundidade – muitas folhas. Que esta seja uma lição para nós. Não há desculpa para ser improdutivo. Alguns poderiam dizer “não sei o suficiente…”. Mas isso não é desculpa. Ou então: “Não estou bem, não tenho muito talento, as condições não são as melhores, o meu ambiente…” Estas também não são desculpas. Que pena o homem que se adorna com a folhagem de um falso apostolado, que tem toda a aparência exterior de levar uma vida frutuosa, mas não está sinceramente a tentar dar frutos!

Todos aqueles que negligenciam dar frutos espirituais podem apontar alguma desculpa: Não sou padre ou religioso; não conheço a Fé o suficiente; não sou boa pessoa; os meus amigos não querem ouvir falar da Fé; estou demasiado ocupado neste momento, etc. Cada um de nós pode encontrar alguma razão para que não seja a nossa época a florescer, por que devemos esperar até mais tarde. Ao amaldiçoar uma árvore que também parecia ter uma “desculpa” para não florescer, Jesus está a mostrar-nos o que pensa desta desculpa.

Isto também explica porque é que tanto Mateus como Marcos especificam que a árvore era uma figueira com “nada mais que folhas” (Mat. 21:19). A primeira menção de folhas de figueira nas Escrituras está de volta ao Jardim do Éden. No momento da queda, “os olhos de ambos foram abertos, e eles sabiam que estavam nus; e coseram folhas de figueira e fizeram para si aventais” (Gn 3,7). É aqui que se obtém a folha de figueira inglesa, referindo-se a “algo que esconde ou camufla, geralmente de forma inadequada ou desonesta”

Quando Jesus chega à árvore, não encontra frutuosa, apenas folhas de figueira. Que o mesmo não seja dito de cada um de nós no Dia do Julgamento.

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